O fluxo haitiano, que teve papel decisivo na modernização da política migratória brasileira na última década, enfrenta hoje uma queda expressiva na participação no mercado de trabalho formal e um crescimento acentuado das vulnerabilidades sociais. A conclusão é do estudo “Análise de dados secundários sobre a integração socioeconômica da população haitiana no Brasil”, lançado na terça-feira (9) na Universidade de Brasília.
Produzida pelo Observatório das Migrações Internacionais (OBMigra) em parceria com o ACNUR, a pesquisa sistematiza dados oficiais de 2010 a 2024 e recoloca a comunidade haitiana no centro do debate público, especialmente diante do risco de invisibilização do tema.
Flávia Reis, Diretora Nacional do SJMR, que participou do painel sobre documentação e registros de pessoas haitianas durante o lançamento da pesquisa, disse que estudos voltados especificamente à população haitiana são fundamentais frente ao cenário recente de invisibilização. “Esse estudo recoloca a população haitiana no centro do debate. Quando se trata de direitos, nenhum fluxo se sobrepõe aos demais”, afirmou.
Para o ACNUR, a sistematização desses dados é fundamental para orientar respostas mais eficazes. O representante da agência, Davide Torzilli, destacou que a análise contribui diretamente para o aprimoramento de políticas públicas sustentáveis e embasadas. Segundo ele, compreender a realidade da população haitiana de forma abrangente é essencial para que governos e organizações atuem de maneira coordenada.
Essa perspectiva se alinha às preocupações de entidades da sociedade civil que atuam diretamente no atendimento a migrantes. Flávia explica, ainda, sobre a necessidade de assegurar proteção contínua. “O fluxo haitiano permitiu ao Brasil ampliar o olhar sobre mobilidade humana e construir respostas mais eficientes. Mesmo assim, ainda observamos desafios que se repetem, principalmente no período posterior à regularização migratória dessas pessoas”.
Novo retrato da comunidade haitiana
A preocupação com o acompanhamento pós-regularização também se relaciona diretamente às mudanças no perfil socioeconômico da população haitiana no país. Nos últimos anos, aconteceram transformações que exigem respostas mais específicas e sensíveis às diferenças de gênero, idade e composição familiar.
Segundo a pesquisa, 67% das famílias haitianas registradas no CadÚnico em 2022 viviam em situação de pobreza ou extrema pobreza, com renda per capita inferior a R$ 218. O estudo aponta ainda uma predominância feminina nos cadastros, muitas vezes com mulheres chefiando núcleos familiares inteiros.
O aumento na proporção de crianças e idosos também demonstra a consolidação de famílias monoparentais e a presença de grupos etários que demandam maior atenção do poder público. Sobre isso, Flávia explica que “é um público mais exposto a vulnerabilidades e que exige orientações claras, materiais acessíveis e oportunidades reais de autonomia, inclusive através do empreendedorismo.”
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